O texto fala por si. O que estamos tentando há anos é uma mudança de paradigma, de estrutura de Segurança Pública que enxergue o cidadão e o policial como detentores de direitos e deveres. Segurança Pública é obrigação do Estado e dever de todos. Ser policial é uma escolha de vida que como tal precisa de dignidade. A quem interessa essa situação de caos? Com certeza não atende aos profissionais de segurança...
Desvalorização do Policial - Quem quer manter a ordem? Quem quer criar desordem?
Por Ivenio Hermes Junior - Rio de Janeiro(RJ) - 11/06/2012
Fonte: Fórum Brasileiro de Segurança Pública
1 Paradigma
Pós-ditadura
O Brasil conserva um paradigma de instituições policiais que
pouco evolui mesmo com a demanda da sociedade pós-ditadura militar. O país
ainda não encontrou seu modelo próprio e ao imitar as polícias estrangeiras, os
seus agentes se veem cada vez mais perdidos na diversidade de técnicas que
precisam aprender e constantemente mudar.
Encapsulando esse problema existe a falta de regulamentação
do artigo 144 da CF/88, que ainda mantém em seu ordenamento uma polícia que de
fato nem existe mais. E essa falta de objetividade e intenção de esclarecer
como deve ser gerida e organizada a carreira policial, enfraquece todo o
sistema de segurança pública da nação, tornando-a pouco capaz de fornecer o
serviço de proteger e servir que a população necessita.
Nesse redemoinho de inação ou falta de vontade de agir, os
integrantes das carreiras policiais são apanhados e veem seus sonhos de prestar
um bom serviço ao povo brasileiro e serem reconhecidos por isso, ir esvanecendo
como toda boa ilusão.
Por que nossa segurança pública continua tão fragilizada? A
quem interessa manter uma polícia fraca e sem capacidade de funcionar
amplamente? Por que os policiais brasileiros são tão desprezados pelo poder
legislativo e pela mídia? Essas questões irrefutáveis sugerem muitas respostas,
mas é preciso reconhecer algumas delas em busca de equilibrar as ideias para
futuras soluções.
2.1 Plano de Carreira
Para todo sistema biológico debilitado existe sempre um
vírus pronto para atacá-lo e destruí-lo e o mesmo ocorre na segurança pública.
O fortalecimento das carreiras de polícias que deveria ser uma preocupação do
Estado tornou-se objetivo apenas dos agentes policiais e dos órgãos de
representação da classe.
São diversas ações isoladas e algumas poucas comuns visando
o fortalecimento de carreiras policiais, mas nenhuma é proposta pelo Estado.
Cada entidade, buscando sua própria sustentação e melhoria, cria comissões para
elaborar planos, estudar viabilidade salarial, se apoiar em princípios
isonômicos de tratamento para sugerir propostas para estruturar suas carreiras.
Desde 1988 que as entidades representativas de classe e seus
membros individualmente lutam para conscientizar parlamentares sobre a
necessidade da estruturação das carreiras na segurança pública. São comissões
para apoiar este ou aquele departamento de polícia, e os sucessos dessas
empreitadas foram eventualmente deveras pontuais beneficiando umas poucas
carreiras e mesmo assim nem sempre na sua totalidade. E o insucesso em angariar
a simpatia de parlamentares faz com que em cada eleição haja mais policiais
tentando a carreira política objetivando fortalecer a representação dos
interesses dos policiais no poder legislativo.
Ser policial não é para qualquer um. Fácil eu ser
entrevistado aqui por você, em um hotel, enquanto outras pessoas estão tomando
tiro de fuzil. É difícil a atividade policial. A sociedade precisa entender que
são pessoas diferenciadas, que tem amor pelo que fazem. Veja que sou do
Ministério Público não sou da polícia. Vejo por exemplo você fazer uma incursão
na favela, todo dia no Rio morre um policial. É difícil, tem que valorizar o
policial.[1]
Assim, temos 27 unidades na federação, cada uma com suas
polícias estaduais com salários, carreiras, estruturas e formas de
funcionamento que as singularizam distorcidamente gerando insatisfação nos
policiais. É comum vermos pessoas atravessarem as divisas de seus estados para
tentarem a carreira policial em outro cujos atrativos nesses quesitos abordados
sejam mais satisfatórios.
E ocorre algo semelhante no âmbito federal. Existem três
polícias sendo que somente duas ainda funcionam. São cargos como agentes,
inspetores, peritos, escrivães, delegados e outros que se digladiam entre si
para obterem as melhores vantagens quando percebem suas carreiras sendo
preteridas em razão de outras.
O servidor público vocacionado para o serviço policial se vê
obrigado a migrar para outras carreiras, temeroso pela instabilidade
interminável que caracteriza a segurança pública.
2.2 Aposentadoria
Especial
Outro direito presente em muitas carreiras típicas de Estado
e que está ameaçada por novas ações do Estado. O policial trabalha arriscando
sua vida, sua saúde física e mental, e quando precisa se aposentar, recebe um
impacto de perda salarial que nada mais é do que um desrespeito aos anos de
dedicação integral ao serviço público.
Sem nenhum demérito a nenhuma outra carreira, é preciso que
o Estado tenha noção de que com atitudes como essa, ele venha a retirar um dos
poucos atrativos de ser policial, que ele gere um esmorecimento no ímpeto
laboral dos agentes policiais, que ele inclusive, promova o aumento de uma
influência da corrupção nas fileiras de órgãos que já sofrem com isso.
O fim da aposentadoria especial não deve ser encarado apenas
como o fim de uma ligeira vantagem financeira para o policial, mas também como
o implementador da perda de saúde por parte dos integrantes da carreira. Um
serviço de alta periculosidade como este, precisa de menor tempo trabalho que o
período atual de 30 anos para a conquista do prêmio merecidíssimo da
aposentadoria.
2.3 Direito de Greve
É o típico assunto que nem deveria ser considerado na pauta
das necessidades da segurança pública de um país que respeitasse seus
servidores policiais. Mas o direito de greve é uma necessidade suprema de quem
precisa de meios alternativos de convencimento da administração pública quando
não é mais suficiente apenas mostrar bons serviços prestados, ou ainda, mostrar
que não presta bons serviços por culpa da própria falta de competência dos
gestores eleitos ou nomeados.
Recomendações como a da ONU sobre a extinção da Polícia
Militar ou do modelo militar de polícia é um caso concreto da tentativa da
influência internacional no Brasil, e vergonhosamente isso se dá porque quase
24 anos após a promulgação da Carta Magna Brasileira, as carreiras policiais
ainda não foram regulamentadas.
O Brasil não valoriza a segurança pública. Aqui nos EUA
percebe-se respeito no tratamento para com os agentes que compõe o sistema
americano, sem comentar os salários. Pelo que sei do Brasil, os salários são
baixos, o sistema de polícia militarizada é arcaico e ineficiente. Por que não se
reforma a segurança pública brasileira? Quem ganha com esse caos?[2]
Isso nos faz retornar ao plano de carreira e à falta de
vontade do Estado em valorizar o serviço policial e à falta de representantes
genuinamente envolvidos com esse problema, não restando aos integrantes outra
alternativa além de buscar o direito de greve como meio de serem ouvidos.
3 Quem Quer Criar
Desordem?
A lacuna deixada pelo art. 144 da CF/88 induz a criação de
diversos dispositivos de segurança privada. As classes mais abastadas pagam por
serviços de vigilância, segurança pessoal e patrimonial que já entram de uma
forma ou de outra nas atribuições policiais, inclusive contratando ex-policiais
ou policiais da ativa para trabalharem em suas horas de folga.
A quem interessa que as carreiras policiais não se
sustentem? A quem interessa a falta de aparelhamento policial?
Certamente não é a maior parte da população. Os grandes
interessados na incapacidade do sistema de segurança pública são aqueles que
seriam afetados diretamente por ela, ou seja, aqueles que querem estar impunes
diante dos crimes que cometem ou dos pretensos prestadores de segurança
privada.
Dentro dessa ideia existem verdadeiros defensores da
desestatização das polícias, pregando a aquisição desses serviços através de
contratos privados que ofendem toda a ideia de imparcialidade desse serviço.
Organizações para-policiais, algumas inclusive de natureza
pública, conseguem autorizações para atuar no campo de ação da polícia,
realizando serviços de patrulha, escolta, atendimento de emergência,
investigação, levantamento de informações e até operações especiais.
Jarret Wollstein defende essa ideia de privatização dos
serviços policiais. O autor já sugere organizações paramilitares para
realização de serviços mediante contratos particulares de prestação de
serviços. Ele mesmo em um de seus textos e afirma que:
Em uma sociedade livre, a proteção policial, como qualquer
outro serviço, seria algo ofertado em bases contratuais, e somente para aqueles
que estivessem dispostos a, e fossem capazes de, pagar por ela.[3]
Através de um argumento de autoridade questionável, o autor
aponta para o colapso da segurança pública somente antes visualizados em filmes
de ficção científica como visto na trama de Robocop – O Policial do Futuro.
Esse conceito está ganhando apoio em políticos e já se
discute a utilização de agentes contratados para certos serviços,
descaracterizando a polícia e usando recursos que poderiam ser usados no
treinamento e contratação de policiais concursados para as polícias
brasileiras.
Portanto, a manutenção da impunidade e a obtenção de lucro
em serviços que já são obrigação do Estado, demonstram o caráter dos principais
interessados numa polícia fraca e sem capacidade ou respeito.
4 Quem quer manter a
ordem?
Apesar de pairar uma dúvida a respeito desse desejo do
Estado Brasileiro, sabemos com certeza que os policiais buscam sua valorização
profissional no intuito de terem maior capacidade de prestar o serviço para o
qual fizeram concurso, curso de formação e foram nomeados.
A sociedade também está muito interessada em que as polícias
estejam aparelhadas, com material humano necessário e trabalhando em condições
adequadas para cumprir suas atribuições estabelecidas na Constituição federal.
Dia 20 de Junho de 2012 será o Dia da Mobilização Nacional
Pela Valorização dos Profissionais de Segurança Pública. Uma grande tentativa
de trazer a sociedade ao debate desse importante momento da realidade nacional.
Associado ao movimento haverá uma campanha de doação de sangue e cadastro de
doadores de medula óssea, demonstrando que se trata de um movimento legítimo,
feito com inteligência para chamar a atenção da administração pública de forma
ordeira e civilizada.
Então fica a pergunta para reflexão: um país que não atende
as demandas de Segurança Pública de sua população está preparado para sediar
grandes eventos?
[1] GRECO, Rogério – em
entrevista para a repórter Anna Ruth Dantas da Tribuna do Norte, no artigo:
“Ser policial não é para qualquer um” disponível emhttp://amaempc.com.br/wordpress/?p=2109 Acesso
em 11 Jun, 2012
[2] Comentário sobre
Salvador ter virado terra sem lei em reportagem reproduzida pelo autor Ney
Machado Disponível em: http://comentáriosfolha.com Acesso em
11 Jun, 2012
[3] WOLLSTEIN, Jarret. Desestatizando
a polícia. Instituto Ludwig von Misses Brasil. Disponível em: http://mises.org.br/Article.aspx?id=767. Acesso
em: 11 maio 2012.
Brilhante texto,acredito que nosso maior problema é que estas siglas que comandam o Brasil há mais de 20 anos,estão se lixando para a coisa pública, para a sociedade e muito menos para as instituições do estado. Ao que parece para estes senhores Instituição do estado apenas e tão somente servem para seus deleites e atos de corrupção, infelizmente como a sociedade não acorda, no que tange a polícia ela é a primeira a sentir os reflexos de uma polícia despreparada e repleta de homens com sérios problemas inclusive psicológicos, devido ao total abandono do estado em relação ao ser humano policial.
ResponderExcluirVerdade e nada mais que verdade!! Infelizmente somos considerados párias socias, entre o infrator e o cidadão. Um ente sem personalidade ou dignidade...
ExcluirBoa tarde!
ResponderExcluirFica claro e evidente que a Polícia atualmente continua a comungar acoes dos primordios de sua criacao.
Caro colega, mais uma vez vejo razão nessas palavras. Cabe agora exigirmos alguma mudança desse paradigma.
ExcluirEnquanto existir militarismo em nossa polícia e um PT cheio de tendências, a sociedade nunca irá se aproximar dessa instituição policial.
ResponderExcluirUma mistura de corrupção e ranços do passado, impedem o Brasil de andar nesta questão. Não tenho esperanças na mudança, salvo por uma grande mobilização da sociedade, coisa que acredito ser mais que difícil.
ResponderExcluirConseg Pari Brás, informativo sobre segurança das regiões dos bairros do Pari e Brás, conseg pari, comunidade network de segurança do Pari, Brás.
ResponderExcluirconseg pari brás.